No meu trajeto para o trabalho, dentro do conforto do meu carro, vejo uma infinidade de paradas de ônibus. Tantas pessoas, tantos semblantes, tantas expressões, tanta diversidade. Mas, especialmente, uma, me chama a atenção. Perto, bem pertinho da minha casa tem um ponto de ônibus e um senhor com os seus sessenta e poucos anos. Traja roupa sempre limpinha, cabelos cortados, barba tão grande que chega a alcançar a altura dos ombros, os sapatos tão lustrados que é bem possível enxergar seu próprio reflexo. Às vezes também o vejo com sandálias franciscanas.
Meu marido me pergunta como é possível ver tanta coisa sendo que o carro está sempre a uns 60km/h. Respondo que a cada dia meus olhos captam um detalhe. Sim, ele está todo o santo dia lá. Sei que não é à espera de nenhum ônibus que o leve a algum destino porque aos sábados passo por esse caminho pelo menos umas três vezes e esse ilustre senhor sempre está lá. Suas únicas companhias são um par de óculos, uma sacola de pano velha, jornais e alguns livros.
Teve um dia que eu estava no banco do passageiro. Tive a oportunidade de olhar fixamente para o velho. Queria que de alguma forma ele percebesse que eu percebia ele. Acho que consegui. O velho viu que eu estava a observá-lo. Fitou o olhar dele até o meu carro “desaparecer”. Fiquei feliz!
Um dia, crio coragem pego meu bloquinho e uma caneta para um bom papo com esse senhor que, com certeza, tem muita história para contar.
3 comentários:
Histórias ele deve ter de monte, que podem ou não ser interessantes, mas como ele se mantem limpo e as vezes tão elegantes acho que é o maior mistério.
Isso só leva a crer que alguém toma conta dele e ele leva esta vida de solidão e dessconforto por pura opção.
Éhhhh, cada um com suas opções....
Sua janela tem lentes de aumento, que na verdade são seus olhos...olhos com sensibilidade suficiente para "perceber"... além...com certeza o senhor, centro de sua atenção, representa muito mais do que a maioria pode perceber...quando vc. fala dos óculos, dos jornais, dos livros, da sacola, do brilho dos sapatos.. leio: hombridade,percepção e muitas experiências de vida!
É difícil fazer o mesmo caminho todos os dias e conseguir perceber coisas novas. Quando a gente percebe, fica surpreso, intrigado, feliz.
Larguei meu carro em Brasília e achei que seria mais fácil perceber as coisas estando à pé, de metrô ou de ônibus, mas aqui não sou eu que corro. O mundo gira mais rápido aqui, deixa a gente meio tonta.
As viagens são longas, apertadas, e qnd dá pra ir sentada, vou lendo um livro pra aproveitar o tempo, com fones nos ouvidos. Me isolo. Quando percebo algo em volta, geralmente é a sujeira das ruas, pessoas miseráveis dormindo nas calçadas. Se quero ver o céu, tenho q dobrar bem o pescoço e mirar bem pra cima. Até qnd vi as capivaras às margens do Rio Pinheiros, fiquei triste, pq elas são pretas e pequenas. O rio tem uma capa grossa e viscosa sobre suas águas. Enfim, reparar nas coisas nem sempre é tão gratificante. Mas dá uma olhadinha nas fotos novas q andei tirando, pois, comoo teu texto, dão uma noção de que o olhar ainda pode enxergar algo de bom.
Saudade punks...
Postar um comentário