segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O Velho


No meu trajeto para o trabalho, dentro do conforto do meu carro, vejo uma infinidade de paradas de ônibus. Tantas pessoas, tantos semblantes, tantas expressões, tanta diversidade. Mas, especialmente, uma, me chama a atenção. Perto, bem pertinho da minha casa tem um ponto de ônibus e um senhor com os seus sessenta e poucos anos. Traja roupa sempre limpinha, cabelos cortados, barba tão grande que chega a alcançar a altura dos ombros, os sapatos tão lustrados que é bem possível enxergar seu próprio reflexo. Às vezes também o vejo com sandálias franciscanas.

Meu marido me pergunta como é possível ver tanta coisa sendo que o carro está sempre a uns 60km/h. Respondo que a cada dia meus olhos captam um detalhe. Sim, ele está todo o santo dia lá. Sei que não é à espera de nenhum ônibus que o leve a algum destino porque aos sábados passo por esse caminho pelo menos umas três vezes e esse ilustre senhor sempre está lá. Suas únicas companhias são um par de óculos, uma sacola de pano velha, jornais e alguns livros. 

Teve um dia que eu estava no banco do passageiro. Tive a oportunidade de olhar fixamente para o velho. Queria que de alguma forma ele percebesse que eu percebia ele. Acho que consegui. O velho viu que eu estava a observá-lo. Fitou o olhar dele até o meu carro “desaparecer”. Fiquei feliz!

 Um dia, crio coragem pego meu bloquinho e uma caneta para um bom papo com esse senhor que, com certeza, tem muita história para contar.

3 comentários:

Unknown disse...

Histórias ele deve ter de monte, que podem ou não ser interessantes, mas como ele se mantem limpo e as vezes tão elegantes acho que é o maior mistério.
Isso só leva a crer que alguém toma conta dele e ele leva esta vida de solidão e dessconforto por pura opção.
Éhhhh, cada um com suas opções....

Leila daibert disse...

Sua janela tem lentes de aumento, que na verdade são seus olhos...olhos com sensibilidade suficiente para "perceber"... além...com certeza o senhor, centro de sua atenção, representa muito mais do que a maioria pode perceber...quando vc. fala dos óculos, dos jornais, dos livros, da sacola, do brilho dos sapatos.. leio: hombridade,percepção e muitas experiências de vida!

elisa disse...

É difícil fazer o mesmo caminho todos os dias e conseguir perceber coisas novas. Quando a gente percebe, fica surpreso, intrigado, feliz.
Larguei meu carro em Brasília e achei que seria mais fácil perceber as coisas estando à pé, de metrô ou de ônibus, mas aqui não sou eu que corro. O mundo gira mais rápido aqui, deixa a gente meio tonta.
As viagens são longas, apertadas, e qnd dá pra ir sentada, vou lendo um livro pra aproveitar o tempo, com fones nos ouvidos. Me isolo. Quando percebo algo em volta, geralmente é a sujeira das ruas, pessoas miseráveis dormindo nas calçadas. Se quero ver o céu, tenho q dobrar bem o pescoço e mirar bem pra cima. Até qnd vi as capivaras às margens do Rio Pinheiros, fiquei triste, pq elas são pretas e pequenas. O rio tem uma capa grossa e viscosa sobre suas águas. Enfim, reparar nas coisas nem sempre é tão gratificante. Mas dá uma olhadinha nas fotos novas q andei tirando, pois, comoo teu texto, dão uma noção de que o olhar ainda pode enxergar algo de bom.
Saudade punks...